segunda-feira, 25 de outubro de 2021

25 de outubro 2021

 Há médicos que são como a ONU e as seguradoras: só servem para quando não há problemas.

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Fazes anos hoje pá!

Fazes hoje anos pá! A nossa casa não vai estar cheia de gente como antigamente mas mesmo assim é garantido que não vai ser um dia igual aos outros. São sete da manhã, não tarda muito descerás do quarto e ouvir-me-ás dizer como de costume: - Bom dia filho dum burro!.. E tu responderás com o teu sentido de humor inigualável: - Bom dia pai dum burro! Que é da minha prenda?

E então eu dar-te-ei a ler estas palavras. 

Tenho aprendido muito contigo. Contigo aprendi a olhar a natureza, o mundo e as pessoas de outra forma. Tens sido uma autêntica lição de vida. Contigo descobri que a natureza nem sempre é harmonia mas que olhos humildes como os teus conseguem sorrir mesmo aos que nos desprezam. Contigo pude comprovar que o mundo pode não estar preparado para nos incluir mas que nós nos adaptamos às suas insuficiências. 

E as pessoas? Ai as pessoas! Esqueçamos aquelas cuja camioneta não aguenta a tua areia e gemem, amocham ou assobiam. Cumprimentemos antes, aos fardos de bacalhau que tanto gostas de distribuir, aquelas que te tratam como amigo! Só elas experimentam o que é receber de ti amizade aos molhos e, claro, o brilho dos teus olhos quando se combina um encontro!

É certo que vivemos no dia a dia algumas angústias, alguns receios e  não olhamos com bons modos o futuro! É também verdade que, por vezes, nos chateamos um ao outro e que temos uma vida cheia de chatices. Mas ninguém imagina como nos fartamos de rir durante o dia, como rimos um do outro, como rimos até da própria morte e temos esperança de vir a morrer a rir por qualquer coisa.

Ah! E já me esquecia! À falta de melhor recordação, lembra-te sempre de que na altura em que fizeste 29 anos fomos ao castelo de Ourém - "Antes" e "Depois"! Pois!... E agora? Agora és tu e deixa-me dizer-te que estás muito melhor na fotografia do que o da estátua!...  

Parabéns camarada! A luta continua!

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Neste últimos tempos

 

O Serviço Nacional de Saúde tem revelado alguns dos seus defeitos e fragilidades mas tem resistido e tem provado que sem ele a tragédia não teria comparação;

O governo tem errado muito ao sabor de pressões e de agendas de propaganda mas é difícil imaginar como seria gerida a epidemia com qualquer um dos últimos dez ministros da saúde;

A oposição tem feito aproveitamento político da desgraça e do descontentamento mas tem sido, de um modo geral, responsável e demonstrado serenidade nas críticas que faz;

O povo nem sempre tem acatado as indicações das autoridades e tem atirado culpas a tudo o que mexe mas tem revelado compreender a gravidade do momento com muita paciência;

Quem tem estado mesmo muito mal é a comunicação social: a fomentar o pânico e a desinformação, a dar voz a especialistas de garagem, a ser a voz do dono que quer um povo de mão estendida, uma oposição bonita, um governo às direitas e um sistema de saúde nas suas mãos.

Eu calo-me e nem sequer os oiço, sei do ditado que esta é a situação em que todos ralham e ninguém tem razão.





sábado, 4 de julho de 2020

25 de abril, 1º de maio e Festa do Avante


25 de abril, 1º de maio e Festa do Avante - a polémica comum que tem sido gerada à volta destas festas, à boleia dos atuais condicionamentos da vida social, vem pôr em evidência aquilo que os principais animadores da mesma andam, há anos, a escrever História para o negar: há um triângulo com estes vértices. 

Podem ir repetindo que o 25 de abril se resumiu a um processo de abertura à democracia e não foi um uma revolução popular de cariz socialista, podem ir tentando transformar o Dia do Trabalhador em dia do colaborador, podem fingir que a Festa do Avante não causa incómodo e repetir com satisfação que "aquilo não são só comunistas". A verdade é que são cravos e bandeiras com uma cor comum contra a qual investem fazedores de opinião acossados pelos seus donos, saudosistas da outra senhora, meninos que foram ao sotão buscar a raiva dos avós salazaristas e gente que tem medo, não só do vírus mas de todas as forças e manifestações associadas a ideais de transformação da sociedade.

E foi por isso que, aprisionados nos seus lares com os seus fantasmas, depois de saberem que o número de pessoas que iam estar na Assembleia no dia 25 de abril era semelhante aos dos outros dias, não conseguiram dar a mão à palmatória e continuaram a protestar. Foi por isso que, depois de terem verificado que as manifestações do 1º de maio decorreram de forma exemplarmente organizada, respeitando as regras de distanciamento físico, não se calaram e continuaram a barafustar. Foi por isso que, a mais de três meses da Festa do Avante, sem ninguém lhes dizer em que modos e condições a mesma se poderá realizará, sem sequer fazerem ideia da evolução da pandemia e quais as regras a exigir, não hesitaram: - É vermelho, é para... (falha do teclado)!

Não os incomodou que o Balola da República fosse à arena do Campo Pequeno anunciar, entre milhares de pessoas, que o Dia de Portugal seria assinalado por oito pequenas almas; ficaram de bico calado quando o Raça de Coiso (que também é contra as três coisas) se juntou com as da sua raça numa vergonhosa manifestação; não se erguem contra as condições em que viajam diariamente para o trabalho os servos da Lisboa chique, não, nada disso surge aos seus olhos como vermelho.
Caiu-lhes a máscara!

Uma coisa é certa, sem haver festas, falou-se mais este ano em 25 de abril do que em outros anteriores; as manifestações do 1º de maio de 2020 deixam para o futuro imagens históricas, a Festa do Avante, habitualmente silenciada e ignorada pela comunicação social, nunca foi tão falada e já tem publicidade para os próximos anos.
- Atão e a Festa do Avante, pá!?

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Quando um homem sozinho faz o arraial


Era de esperar que hoje de manhã tivesse despertado com o som da alvorada da festa da minha aldeia. Isso não aconteceu e, ainda entre os lençóis, cismei: 
- Já não é a primeira vez que os mordomos apanham um cabra na véspera e, no dia da festa, não acordam para deitar a alvorada!
Eram dez horas e, não ouvindo o som das cornetas com a música do Quim Barreiros, pensei: 
- Se calhar o leitor de cassetes avariou! Também não faz falta, a festa costuma ter barulho a mais!...

Também não era à hora da missa, eu que não sou dessas coisas e acho mesmo que não fazem justiça à tradição da terra, que eu iria até ao recinto. Nem mesmo ao almoço tenho ido porque não gosto de ver mesas de noivos sem ser em casamentos e cansei-me de me darem cabo da refeição com discursos de chacha e pedidos de salvas de palmas!

Quando à tarde me decidi a sair de casa e ir até ao arraial, estranhei ver tão poucos carros nas imediações e conclui: 
- Isto é sempre a mesma coisa, o pessoal só se junta em força ao fim da tarde!

Quando finalmente ia a chegar ao largo abeirou-se de mim o "homem da bicicleta com muitas luzes" e perguntei-lhe porque é que este ano a festa estava tão fraca. Respondeu-me que o pessoal não saía de casa com medo que lhe pegassem a constipação.
- Ora porra! Eu bebia ao menos uma cerveja!

Não me ligou e destravou pela rua abaixo enquanto eu fiquei a congeminar um cigarro de abalada. Não tardou muito que o avistasse de novo a pedalar ladeira acima e me estendesse à mão duas minis, uma para cada um, portanto.
- São as duas para ti que eu não bebo!
- Ah! Muito obrigado!
- Passa mas é para cá cinco euros e deixa-te de obrigados!

Paguei-lhe e ele deu meia volta. Ainda pensei ligar a um amigo ou outro para fazer a festa mas, na verdade, tenho andado um pouco constipado. Permaneci ali algum tempo, com uma mini aberta em cada mão, com uma mão a falar com a outra, bebendo ora de uma, ora de outra e acabo de chegar a casa a pensar como foi eficiente o mordomo e como foi boa a festa da Cartaria.

O que será deste país sem os exames nacionais?


O normal funcionamento do sistema educativo é um problema menor no contexto da atual crise com que nos deparamos. No entanto, governo, meios de comunicação social e comunidades escolares parecem ter encontrado aí uma distração para aliviar outras preocupações e responsabilidades que a situação lhes exige. E, como se não bastasse, como centro desta problemática secundária, os exames nacionais do ensino secundário têm meio país suspenso à espera duma resolução.
A importância dos exames nacionais tem vindo a crescer, ao longos dos anos, a pretexto de atestar a eficiência do ensino escolar quando, na verdade, não passam dum falso indicador, cujo papel mais relevante se reduz a, por métodos meramente quantitativos, distribuir os jovens pelas cadeiras do ensino superior e, em particular, a limitar o acesso dos candidatos ao sonho das faculdades de medicina.
O ambiente de medo e de ansiedade que, quer da parte de professores, quer de alunos, rodeia habitualmente a realização destas provas, resultado de todo o folclore normativo que se foi desenvolvendo à volta delas, roça já a dimensão do paranóico e do ridículo. Chegou-se ao ponto das regras limitarem às professoras vigilantes o uso de saltos altos ou de mini-saia, aos professores vigilantes o uso de sandálias ou de calções, das garrafas de água que os alunos levam não poderem ter rótulo, das tesouras que abrem os envelopes dos enunciados terem 15 cm, das provas de resposta serem transportadas em carros da polícia, das escolas verem, perante a opinião pública, a avaliação do seu trabalho quotidiano reduzida à análise de pautas de resultados de exames nacionais.
O sistema evoluiu para este formato avaliativo, paranóico e ridículo, mas nem sempre foi assim. Por exemplo, nos anos do 25 de abril houve reboliço e revolução no sistema educativo, houve muitos casos em que o ano letivo só se iniciou em novembro ou em janeiro, houve até passagens administrativas e não consta por isso que a geração formada nessa altura não tenha vindo a  cumprir a sua profissão de forma competente.
Acautelemos a nossa saúde, cuidemos dos doentes, enterremos os mortos, sejamos solidários, exijamos justiça social, contribuamos para a economia necessária às nossas vidas e não nos preocupemos com os exames nacionais que as universidades têm lugar para todos e o momento sugere-nos que de futuro haverá muitas vagas para medicina.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Parábola para quem não consegue ler mais de duas linhas.

A primeira razão daquela civilização era mudar a face da terra, o que significava torná-la plana, eliminando os vales e os montes. Passara o tempo das pás e picaretas e o desenvolvimento trouxera escavadoras, giratórias, niveladoras, cilindros, camiões e outras poderosas máquinas de terraplanagem.

A Terra Plana resultara duma associação de outras empresas da Zona Centro e era a sociedade que dava cartas aos territórios vizinhos. Pela sua ação, povoações que outrora se debatiam com as agruras do relevo, locomoviam-se agora confortavelmente por todo o lado, excepto, claro está, pelos vales e  montes que iam deixando de existir.

A Mexe Terra era uma pequena empresa da Zona Sul e não dormiu enquanto não conseguiu um tratado de união com o seu sucesso de referência, a Terra Plana. Para lá dos donos, os mais civilizados, também os seus trabalhadores deitaram foguetes e deram vivas a máquinas novas que chegariam, a novas condições que os igualariam aos centrais e, sobretudo, à visão futura da imensa planície em que iriam transformar a sua terra.

A Terra Plana dotou-a, de facto, de máquinas melhores mas eram as usadas que já não lhe serviam, forneceu-lhe financiamentos para algumas movimentações de terras de interesse central mas aumentos de rendimentos? "nem pensar! porque é precisamente nos baixos salários que vós sois bons e, atenção, o mármore é para nós e o mar é nosso!".

Chegados ao presente, os trabalhadores da Mexe Terra vão reconhecendo o engodo e questionam os patrões mas estes, que apesar de tudo melhoraram os seus meios de locomoção e gozam de prazer quando se sentam à mesa com os maiores do Centro, respondem-lhes com a impossibilidade de sobreviverem fora da Terra Plana, com a necessidade da construção do caminho único como forma de tornar lisa e suave a face das terras do Sul.

Será já no futuro que os filhos dos operadores das máquinas e todos os sulistas, apercebendo-se da infertilidade da terra movida e que a vida não tem jeito nenhum sem montes e vales, tomarão o poder apropriando-se das máquinas para abrir vales e erguer montanhas.

É provável que ainda vão a tempo, pena que o profeta já tenha morrido.

Patrão da Mexe Terra preparando-se para assinar a entrega da sua empresa e o futuro dos seus trabalhadores à Terra Plana.